terça-feira, 7 de junho de 2016

A pintura do desconhecido

Quando o assunto é artes plásticas em Cabo Verde, nomes sonantes vêm à mente. Entre os quais Kiki Lima, Tchalé Figueira, Nela Barbosa, Danny Spínola, entre outros. A arte que se faz pelas mãos destes senhores é conhecida e reconhecida a nível nacional e internacional.

São outros tantos que, com lápis e pincéis, poisam sobre uma tela assuntos mil. A história da pintura cabo-verdiana ganhou os seus contornos após a independência nacional, em que houve uma massificação e encorajamento no sentido de se investir em tudo o que seja cultura nativa, tendo, por conseguinte, surgida na fase do grito de liberdade e de busca das raízes.

Esse período está impregnado de pinturas nativistas e intervencionistas, na linha da arte comprometida, engajada, em que sobressaem: como que em cânticos, figuras de heróis-pátrios e universais, paisagens agrestes e ressequidas; cenas de trabalhos vários, alguns de cariz esclavagista e do realismo social, aspetos degradantes da sociedade, como a fome e a miséria; o canto à luta e à liberdade, a par do retrato fiel de paisagens pitorescas e da natureza morta, realistas e impressionistas.

Com o advento dos meios de comunicação social, que possibilitaram a diluição de fronteiras físicas e o contacto permanente com outras realidades, a pintura cabo-verdiana sofreu uma evolução considerável no que tange à mudança da temática. Pois, se antes os artistas retravam o grito da liberdade, anos após a independência eles passaram a retratar aspetos concernentes ao quotidiano, com imagens ligadas ao trabalho, ao lazer e às manifestações tradicionais da cultura popular.

Outros em explosões de cores exuberantes, mescladas de algumas formas figurativas, mas muito esbatidas ou labirínticas e com um número de pintores bastante heterogéneos, tanto no domínio da técnica como no da temática, que abrangem desde expressões e linguagens realistas, surrealistas, concretistas, etc., e que retratam todos os quadrantes da atual sociedade cabo-verdiana a nível social, político e religioso, bem como as questões metafísicas e filosóficas.

Atualmente as artes plásticas em Cabo Verde abrangem centenas de criadores e a cada ano surgem novos nomes a tentar conquistar o seu espaço num mercado escasso, mas bastante dinâmico.

Exemplo disso é o jovem Yuran Henriques, um amante de artes plásticas. Segundo o artista, a sua paixão pela arte nasceu a partir do momento que começou a ler banda desenhada e começou também a tentar fazer, e isto sempre fez parte das suas raízes familiares desde criança.

Nas suas obras, Yuran retrata a sua vida e o quotidiano ao seu redor, nomeadamente as suas emoções, os seus pensamentos e os diversos problemas que a sua comunidade enfrente nos dias atuais. “Pretendo transmitir a vida tal como a vivo. Eu não concebo o artista fora da sociedade, em termos teóricos um artista é sempre um ser (homem ou mulher) que vive numa sociedade. Portanto o que é o artista? O artista é aquele que é, o porta-voz dessa pequena ou grande comunidade, é um porta-voz do tempo que vive, é um porta-voz da sociedade em que está integrado e onde deve procurar estar profundamente ambientado nessa sociedade”, afirma.

Henriques ainda diz que deve também fazê-lo com honestidade. Que isto o levará a transmitir a interpretação da vida, de si próprio, dos outros e do mundo que o rodeia, isto é, “a arte é uma posição política na medida em que o artista toma a posição de porta-voz, mas é também um exercício de crescimento de conhecimento, a arte é um exercício de conhecimento das coisas, dos fenómenos das pessoas, dos sentimentos e das coisas”, realça o jovem.

À semelhança de qualquer artista, Yuran diz que a sua inspiração se encontra no trabalho, pois gosta de trabalhar para descrever o que sente através dos seus sentidos, usando o seu conhecimento.

Yuran Henriques carateriza-se como um pintor apaixonado, jovem e determinado fã de Xand Silva isto porque diz q que faz grandes exposições “que nos puxam pelos cabelos e nos arrastam pela estrada da nossa interioridade em busca de um sonho, de uma fantasia, ou mesmo de um silêncio ou de um grito que nos permite a intelecção do que vemos e, consequentemente, uma interpretação mais comedida com a intuição inconsciente ou conscientemente processada pelo artista e pela sua estética sugestiva, psicanalítica”, explica.

O jovem artista diz ter sonhos. Como projeto futuro tem em mente uma exposição cujo lema é “arte urbana” que iniciará num espaço fechado e, a posteriori, levá-lo-á às ruas.

Yuran deixou um apelo aos colegas artistas pedindo que estes exercitam a sua criatividade e trabalhem suas emoções e pensamentos independentemente da qualidade que os coloque num quadro a base de tintas.

Outra personagem que tem enriquecido a pintura nacional é Aladjidrame. Era um dia qualquer de um mês que já não se recorda do ano 1999, que o senegalês chegou em Cabo Verde. Aladjidrame garante que sua chegada no arquipélago foi “obra do destino”, pois afirma levar uma vida “tranquila” dedicada à pintura.



“Gosto muito de pintar, e com o tempo percebi que no mercado existia carência de alguns produtos africanos, que retratam a nossa realidade, deste modo, escolhi relatar a vida da mulher africana no meio rural, nas suas múltiplas funções”, conta o senegalês, concluindo que a mulher é a sua inspiração, pois, “ela é batalhadora, defendo que devemos acreditar mais nas mulheres, porque elas têm uma boa visão, e sempre destacam em tudo que fazem”.

Aladjidrame conta que o Ipericentro é o seu espaço de trabalho e onde vende os seus quadros que variam de quinhentos a vinte mil escudos.

Segundo o supracitado “é possível viver só de artes em Cabo Verde, visto que, temos compradores tantos nacionais e internacionais, e vendo os meus produtos em várias ilhas (Praia, Sal, Fogo, Boavista), e também na diáspora”. 

O Ipericentro é apenas uma das “casas de arte” da cidade da Praia. Podem se encontrar obras de arte expostas em várias livrarias da capital, na Biblioteca Nacional, no Palácio da Cultura Ildo Lobo, e em outros espaços pontuais.

Hoje na pintura insere-se uma quota parte dos artistas nacionais e estes têm colocado seus trabalhos em muitas exposições, não só em Cabo Verde, como também em países como Portugal e Estados Unidos o que vem dando-lhes mérito e reconhecimento.
Por: Grace Cabral

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